sábado, 23 de julho de 2011

ADIÇÃO

Todos os excessos são condenáveis, até mesmo os da abstinência (Voltaire)


Seus companheiros
de ilusão
quem são?

Com o que combate
o horror à solidão
e tenta esquecer
que não tem mais sonhos?

Como lidar com o real
cada vez mais
avassalador?

Ao mal estar
você soma
a dependência
de algum paraíso artificial?

Crê precisar
de subterfúgios
para criar?

Só assim
as portas da percepção vão se abrir
céu e inferno
se intercambiar?

O que a literatura pode
(meio ou fim)
significar?

De que modo atravessa
o crespo do seu sertão
esse deserto da alma:
o liso do Sussuarão?

Se embriaga
se entorpece
quando não consegue
dizer não?

Que veredas percorre
em busca da fantasia
de completude?

Diga-me onde te abasteces
e dir-te-ei
quem não és

Na boca de fumo?
Num Mc da vida? (a droga do junkie food)
Na farmácia?
No botequim?

O que o ajuda a encarar
a falta, o excesso
o lusco-fusco da alma
seu Diadorim?

Tal linha de fuga
que prazeres
proporciona?

Estados alterados lhe dão (ou tiram)
vontade de que?
Que tonalidades o mundo perde
ou adquire?

E depois, o que suas sábias vísceras
denunciam?
Espasmos de culpa ou remorso
revém?

Ana Guimarães

7 comentários:

  1. Um dos melhores poemas até então lido em blogs.
    Na verdade temos grandes sertões veredas em nosso corações. Só desconfiamos ter, mas não ousamos nos aventurar, exceto se a aventura for por meio de livros, que é uma tentativa de reconhecimento de si que é o outro. Existem outros sertões. Os sertões estão por todas as partes férteis desse mundo. Vamos nos apropriar do que é bom, logo, roubo o seu poema e me alimento das suas palavras para o todo sempre.

    Obrigado pela beleza questionadora.

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  2. Querida Ana,

    Como é bom sentir em seus versos a importância do verbo sonhar. Nesse poema você foi além do questionar.

    Obrigada, querida, pelo seu comentário em meu blog pela exposição dos minicontos.

    Beijos, com carinho
    Madalena

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  3. Jádison: seja bem-vindo e muito obrigada pelo comentário! Volte sempre. Abraços

    Madalena querida: obrigada! Senti sua falta no encontro com a Luiísa e o Renato Ribas. Beijo

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  4. 'Adição' menciona a avalanche do real, e estabeleceu, abriu, um diálogo com a poesias posteriores.
    James Ellroy (Meus lugares escuros) disse também:
    "Sua morte corrompeu minha imaginaçaõ e me concedeu dons que eu podia explorar. Ela me ensinou a auto-suficiência através de um mau exemplo. Eu possuía características de autopreservação até mesmo no auge de minha autodestruição. Minha mãe me deu o dom e a maldição da obsessão. Começou como curiosidade, em lugar de uma dor infantil. Brotou como a busca de um conhecimento sombrio e transformou-se numa terrível sede por estimulação sexual e mental."
    Gostei, e os elogios são mais do que merecidos, são dignos de você e sua obra. Beijos.

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    1. Puxa, Djabal, me desculpe, só hoje - agora - estou vendo o seu comentário:

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    2. Puxa, Djabal, me desculpe, só hoje - agora - estou vendo o seu comentário:

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