MINHA SOMBRA E EU
Minha sombra e eu fizemos um
trato
andamos juntas
como Sócrates e seus
discípulos
nos jardins da vida
somos diferentes, é claro
sou radiante
ela é sombria
preciso da luz do dia
ela tem fronte lunar
governa-me o coração
ela, a razão
entrego o que me pedem
ela mede, pesa, avalia
meu canteiro, com belas flores
volta e meia se enche de mato,
é fato
no dela, nenhuma erva daninha
(também a terra é estéril,
nada germina)
minto, trapaceio
sou de extremos
dona sombra é um tédio,
com o seu
"a virtude está no
meio"
de qualquer barro
faço Adões e Evas
amores ou amigos
para ela tudo é escarro,
espinho
por ela viveria sozinho
quando fervendo, meu
refrigério
maníaco, meu lado sério
preparo o pulo, ela o impede
se o considera por demais
arriscado
pretendo-me eterno
ela me mostra mortal
quero saltar um abismo
e
lá vem ela com o projeto da ponte
já em algarismos
quando exijo o real
me oferece a ficção
acha que a poesia me consola
o que é verdade, pero não toda
insiste que eu me cubra
com o manto da
imaginação
mas sei que esse canto
por mais doce
é pura ilusão
por de sol algum, aqui ou ali
pintado
consegue expressar a emoção
daquela tarde
prazer que nenhum pavão
da arte
encena
Ana Guimarães